24/03/2010

Verões diferentes


Chegado e verão fechava-se a casa da foz do Douro e rumava-se de comboio a Barqueiros. Eram quase 3 meses (de princípios de Agosto até ao fim da primeira semana de Outubro) que os esperavam. O ar fresco da maresia era trocado pelo calor das encostas durieneses, pela sombra de algumas das árvores onde um fruto acabado de colher tinha um sabor que nunca mais se conseguiu esquecer. A água da mina que ficava ali no quintal ajudava a combater o calor. Eram 8 irmãos e mais alguns primos que enchiam de risos, correrias e brincadeiras toda aquela região. O meu pai, o mais novo de todos foi o que não pôde disfrutar até á idade adulta tais verões, pois a morte do seu pai, meu avô, quando tinha apenas 12 anos, e as vicissitudes próprias destas situações, terminaram na venda da maior parte das propriedades e apenas ficou a casa de família. No entanto as recordações de tão fortes que foram ficaram para sempre e de forma tão viva que nos foram passadas a nós filhas como se aqueles verões tivessem acontecido apenas alguns anos antes. Estive sentada com o meu pai a comer figos da mesma figueira que dava para a janela do seu quarto. Foi lá que percebi finalmente a recusa triste do meu pai a todas as uvas compradas no Porto pois o sabor das diferentes castas (moscatel de hamburgo, moscatel de Jesus, mourisca, rosac e tâmara).
As propriedades iam da Aldeia de Vale Penteeiro onde ficava a casa, à quinta principal, Bela Vista tinha uma vista maravilhosa para o Douro que corria lá baixo e onde passava o comboio ainda a carvão, (onde eram feitos os pic-nics de família) onde tinha penedos enormes cobertos de musgo e com um souto de cerca de 30 castanheiros. Noutra encosta havia a Costeira, onde nascia o ribeiro que ia dar á mina de lá de casa, e inúmeras árvores de fruto (cerejeiras, laranjeiras, tangerineiras, pereiras, ameixoeiras, ginjeiras) situada na margem direita do Douro onde o sol incidia directamente.
Ao escrever estas linhas a certa altura liguei ao meu pai para me relembrar quais as castas da uvas e estivemos uma data de tempo ao telefone enquanto recordava uma vez mais a belíssima infância que lá passou...demasiadas memórias para caberem nas linhas propostas para este post :)
Nota: Barqueiros do Douro tem origem no ofício dos seus habitantes que construíam e governavam os barcos Rabelos, que transportavam o vinho até às caves. É em barqueiros que começa a região demarcada do Vinho do Porto.
Nota2 - A foto é retiradada net e é da casa da quinta da Vista Alegre que pertencia aos meus tios (irmã mais velha do meu pai) embora apareça muitas vezes mencionada de forma errónea como tendo sido construída por Espanhóis. Ela foi comprada posteriormente por eles.
Esta foi a minha participação na blogagem de Março aqui :)

10 comentários:

mjf disse...

Olá!
Que belo texto!
Descreves coisas lindas da tua infância, que eu uma pessoa 100% urbana me encanta e esforço-me por imaginar:=)))

Beijocas

paulofski disse...

Olá. É engraçado como as coisas são bzinha. somos vizinhos de bairro e os nossos progenitores bizinhos de freguesias da encosta direita do Douro. De Barqueiros a Frende distam poucos quilómetros e este teu belo texto trouxe-me de volta as memórias dos verões que vivi intensamente na terra dos meus avós, da minha mãe, das aventuras que tive numa terra que já não é a mesma, só um pouco mais diferente, mais moderna.

Beijinhos

Helena Teixeira disse...

Olá Ka!
Já sabe que eu adorei o seu texto.Acho que tem um cheiro diferente, um aroma especial :) Um dia,ainda vou andar num barco Rabelo e visitar as caves do Douro e quem sabe passar na terra que tão bem descreve.

Como as férias da Páscoa,aproximam-se,Aproveito e deixo um convite: participe na Blogagem de Abril do blogue www.aldeiadaminhavida.blogspot.com. O tema é: “Páscoa na minha Aldeia”. Basta enviar um texto máximo 25 linhas e 1 foto para aminhaldeia@sapo.pt (+ título e link do respectivo blog) até dia 8 de Abril. Participe. Haverá boa convivência e possíveis prémios (veja mais dia 29/03 no blog da Aldeia)!

Jocas gordas
Lena

Kok disse...

Muito bela a região das tuas origens (que já é património da mundial, creio) bem como das pessoas que lá habitam.
Acho que esse tal "património da humanidade" deveria ser extensivo aos seus habitantes e não somente à região física.
Mas isto são ideias minhas, importantes para mim por isso mesmo! São minhas.
Voltando ao texto: para quem já viveu no campo ou lá tenha passado férias prolongadas, é fácil "ver" o que escreves e até sentir o cheiro (os cheiros), sempre agradável e sempre diferente conforme o dia vai correndo, e a noite vai passando.
Porque a memória olfactiva é tão ou mais forte que a visual, há cheiros que nos transportam para locais que já tínhamos esquecido e trazem-nos à memória situações então vividas.
Este teu texto também me avivou recordações de outros campos, outros sons e outros odores.

Pronto, termino já.
Beijokassss

Ka disse...

mjf,

Não são da minha infância, oxalá tivessem sido que eu teria adorado :)

Beijinho

Ka disse...

Paulofsky,

ó "bivinho" ao quadrado :D
Com sorte os nossos progenitores conhceram-se ou cruzaram-se nas suas infâncias..

Beijoca

Ka disse...

Helena,

Antes de andar de rabelo e visitar as caves, comece por uma visita ao Douro. Verá que o Vinho do Porto terá então outro sabor :)

Obrigada pelo convite para a blogagem de Abril mas desta vez terei de recusar no entanto nas próximas tentarei participar com todo o gosto :)

beijinho

Ka disse...

CAríssimo Kok,

Que bom ter-te por este meu canto :)

Concordo plenamente com a tua teoria de o patrimínio ser extensivo também ás gentes. Tenho a noção que apesar de barqueiros ser lindíssimo a ligação forte que lhe tenho é-o essencialmente por tudo o que me foi transmitido quer pelo meu pai e pelos meus tios quer pelas pessoas da aldeia, algumas filhas de pessoas que trabalhavam com os meus avós e partilhavam brincadeiras com o meu pai e irmãos. Uma das coisas que me impressionou foi perceber o quanto ainda se lembravam e gostavam do meu avô (que morreu em 1952) passados mais de 30 anos da sua morte.

Quanto á memória olfactiva eu tenho-a muito viva :D

Beijoca :))

O Encapuçado disse...

Olá Ka, que giro, apanhei-te pelo meu blogue,e stava a evr os coments de há dois anos, quase quando fui fazer o implante...

O Douro fui com o grupod e Tabuaço até la´em setembro passado, uma maravilhosa realidade..pessoas queridas, lindas e bela spaisegens Durienses..
Como vais mais o mais pequenito? aquele abraço da Laura..



ahhh o Paulofski já o conheci quando estive com uma amiga minha no Por. ahhh que giro, gostei de o ver, um nino ás direitas..aquele abraço apertadinho, laura

Helena Teixeira disse...

Coucou Ka!
Ah pois,1º visito o Douro e bebo uns cálicezinhos e o melhor depois é ficar sentadinha num banquinho,ihihihhi... ;)

Jocas gordas
Lena